Bruna Miyuki
Bruno Codogno
Tamiris Anunciação
Fotos: Bruno Codogno
Em menos de um semestre de gestão, o governo de Jair Bolsonaro enfrentou manifestações pela educação em todos os estados brasileiros. As mobilizações da última quinta-feira (15) contaram com estudantes, professores e servidores públicos que reagiram aos cortes de aproximadamente 30% sobre as universidades e instituições federais. O bloqueio desses recursos foi anunciado pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, no final de abril e incide sobre as chamadas despesas obrigatórias que envolvem o pagamento de contas de luz, água e telefone, os serviços terceirizados, a verba para pesquisas e o investimento em equipamentos e obras.
A ausência do investimento afeta quase 70 instituições de ensino superior do país. O bloqueio do orçamento também impediu a distribuição de bolsas de pós-graduação que eram disponibilizadas pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Em todo o país, os cortes atingiram mais de 3000 bolsas. Vale ressaltar que, segundo relatório da consultoria Clarivate Analytics de 2018, mais de 90% das pesquisas no Brasil são feitas em universidades públicas. Essas pesquisas permitem o desenvolvimento de vacinas, a busca por curas de doenças, projetos de educação e arte e serviços de atendimento a comunidades de todo o país. Em Londrina, as manifestações em defesa da educação duraram o dia todo e agregaram diferentes setores, lotando o calçadão da cidade.
Sindicatos: a luta pela educação e contra a reforma de previdência
Durante a manhã, mais de mil pessoas se reuniram em frente ao Banco do Brasil. Ao lado de um carro de som, lideranças de diversas categorias (funcionários públicos de Londrina, servidores, técnicos, professores do ensino superior e básico) discursavam para a multidão inflamada. As palavras de ordem eram principalmente contra os cortes na educação, mas o debate acerca da previdência também permeava as discussões que contaram inclusive com um abaixo-assinado contra a reforma.
Rogério Martins é representante do Sindicato dos Trabalhadores da Educação Básica, Técnica e Tecnológica do Estado do Paraná (Sindiedutec) em Londrina. Segundo ele, 25 campus dos institutos federais do Paraná paralisaram completamente contra os cortes anunciados, que atingem o funcionamento básico das instituições. Ele ressalta que as mobilizações não são apenas pelo congelamento de 30%, mas pelo projeto de educação do governo Bolsonaro. “O governo apresentou um planejamento em que o ministro da educação retirou as universidades e os institutos. Ele diz que se deve retirar os recursos das universidades para colocar nas creches, mas as creches também vão ser prejudicadas. Muitos professores de creches estão aqui nesse momento inclusive. Queremos mostrar a incoerência desse projeto para a educação”, conta ele.
Apesar do impacto de serviços oferecidos pelas universidades à comunidade londrinense, a precarização do ensino superior público por vezes não é reconhecida pela cidade. O presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Superior Público Estadual de Londrina (Sindiprol/Aduel), Ronaldo Gaspar, aponta essa relação por meio do exemplo do Hospital Universitário (HU) cuja precarização é encarada como uma negligência da área de saúde e não da educação. “Muitas vezes, a universidade não se apresenta à cidade como universidade, mas como serviço público. O HU é parte do complexo de educação e pesquisa da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e se não houver investimento na educação, ele também será prejudicado”, ele conta mais sobre o assunto no podcast de Bruno Codogno no fim dessa reportagem.
Um dia após as manifestações, o governador do Paraná, Carlos Massa Ratinho Junior (PSD) sinalizou uma possível redução do repasse de recursos para universidades estaduais. Em janeiro de 2019, o governador do estado já havia realizado um corte de 8,1 bilhões de reais na área de educação em seu orçamento. A partir de agora, Ratinho Junior declarou que pretende realizar uma “gestão eficiente” do repasse de verbas às universidades públicas, utilizando o critério de meritocracia, ao qual se referiu de forma vaga.
Diante da iminência de cortes, agressões e arbitrariedades contra a educação paranaense – e de todo o país – categorias se mobilizam para garantir o direito à educação pública de qualidade e a manutenção de pesquisas e serviços realizados pelas instituições públicas de ensino. No dia 14 de junho deve ser deflagrada uma greve nacional contra a reforma da previdência e que tem previsão de participação dos servidores públicos, professores, organizações sindicais e movimentos estudantis.
Estudantes contra Bolsonaro
Durante a tarde, o Levante Popular da Juventude realizou uma oficina de batuque no centro da cidade. Estudantes do Instituto Federal do Paraná do campus de Londrina se juntaram rapidamente ao rítmico “Fora Bolsonaro”, segurando faixas que haviam confeccionado. Entre os jovens, havia uma energia de oposição direta ao governo como um todo, com dizeres contra o atual presidente.
Durante o protesto, um homem se aproximou e tirou fotografias enquanto jovens do Partido da Causa Operária empunhavam uma faixa de “Fora Bolsonaro”. O homem os chamou de “vagabundos”, mas não houve indisposição entre os presentes que seguraram a faixa com orgulho para a foto. Os estudantes do IFPR também contaram com o apoio de organizações do movimento estudantil que se reuniram nas escadas do calçadão, demarcando sua posição contra as políticas do atual governo na educação. A sede do IFPR em Londrina tem mais de 900 alunos. No Paraná, são mais de 20 mil estudantes (segundo dados da própria organização), cuja realidade seria afetada pela ausência de repasse para o pagamento de contas de luz, água, telefone, dentre outras necessidades básicas.
Christiana Nunes Maia, presidente do Diretório Central dos Estudantes de Londrina (DCE) lembrou que não havia manifestações desse porte em Londrina há anos e elogiou a organização dos estudantes do Instituto Federal. “Os estudantes do Instituto Federal deram uma aula de organização reunindo aproximadamente mil estudantes no calçadão para mostrar os trabalhos que são realizados na instituição que com os cortes só funcionaria até agosto.”
Assim como o Instituto Federal, a UEL organizou também no dia 15, o Calçadão da Extensão e da Cultura. Uma mostra com mais de 50 projetos de extensão e pesquisa da Universidade que beneficiam diretamente a comunidade londrinense. Desde pesquisas no combate à dengue até projetos como o Núcleo Maria da Penha (Numape), que oferece assistência jurídica e psicológica para mulheres vítimas de violência doméstica, foram apresentados no calçadão em frente ao Ouro Verde. A UEL, assim como outras universidades públicas do país, será bastante afetada pelos cortes nas verbas da educação; a não distribuição dos recursos ocasionará o congelamento de quase 30 bolsas de pós-graduação. A universidade que já vem sofrendo com os cortes do governo estadual desde gestões anteriores, tem recursos para sua manutenção apenas até setembro deste ano.
Além do Calçadão da Extensão e da Cultura, os estudantes da UEL decidiram em Assembleia Geral, no dia 14, terça-feira, a participação da classe estudantil na greve nacional da educação. Durante a assembleia representantes do DCE e de outros movimentos, apresentaram a conjuntura política que levou à greve nacional do dia 15 e suas reivindicações. As falas durante a assembleia abordaram a importância da atuação da organização estudantil em conjunto com a classe trabalhadora e incentivaram os alunos a irem às ruas. Christiana Nunes Maia, disse que a manifestação em Londrina superou suas expectativas, mas que ainda não acabou. “Rumo a greve geral de 14 de junho”, convoca ela.
Um dos estopins para a paralisação dos estudantes no Brasil todo foi a declaração polêmica do ministro Abraham Weintraub, que relacionou o corte a atos de “balbúrdia”. Em várias manifestações pelo país foi possível encontrar faixas em resposta à declaração do ministro, uma delas dizia “Balbúrdia é fazer arminha com a mão, empregar miliciano, assassinar vereadora, músico e portador de guarda-chuva, balbúrdia é acabar com a previdência, é fechar universidade, é querer que os outros parem de pensar porque você não concorda. Balbúrdia é ter votado 17 e ainda não ter se arrependido.”
Ouça o podcast de Bruno Codogno: